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Título da história

Do Líbano a Frederico Westphalen

Construção e herança para a cidade

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(Foto: Giovana Zago) 

Frederico Westphalen é uma cidade moldada pelas histórias de seus habitantes, e a trajetória de Samia Younes Prá e sua família exemplifica a força e a contribuição cultural dos imigrantes que ajudaram a construir a região. Samia, psicóloga de 62 anos, é filha de Ahmad Ali Younes, um dos muitos libaneses que deixaram o Oriente Médio durante o século XX em busca de novas oportunidades no Brasil. Essa história é não apenas um conto do passado, mas também um testemunho do legado que essas famílias deixaram até hoje.

O Líbano é um pequeno país do Oriente Médio, marcado por uma geografia montanhosa e uma história de conflitos. Apesar de sua beleza e cultura vibrante, muitos libaneses migraram durante o século XX devido à falta de trabalho e à instabilidade política. O Brasil se tornou um dos principais destinos, oferecendo acolhimento e oportunidades para recomeçar.

Ahmad Ali Younes partiu do vilarejo de Lala, no Líbano, em 1953, durante um período marcado por instabilidades econômicas e pela falta de oportunidades em um país pequeno e com famílias numerosas. A migração de sírios e libaneses para o Brasil, que se intensificou entre 1870 e 1970, foi motivada por uma combinação de fatores, incluindo conflitos locais, crescimento populacional e a integração da região ao mercado global, que prejudicou as economias locais. O Brasil, apesar de não oferecer incentivos governamentais diretos, tornou-se um dos destinos preferidos desses imigrantes por sua hospitalidade e possibilidades de trabalho.


Com apenas 100 dólares e um certificado de sapateiro — profissão que aprendeu para facilitar sua entrada no país —, Ahmad desembarcou no Porto de Santos, em São Paulo. Ele iniciou sua jornada como mascate, vendendo mercadorias no interior paulista e paranaense. Como muitos de seus conterrâneos, Ahmad não dominava o português, mas encontrou formas criativas de se comunicar. Ele carregava um caderno onde colava figuras e escrevia palavras que aprendia no novo idioma, o que lhe permitiu superar a barreira linguística e, gradualmente, se integrar à sociedade brasileira.

Mapa da jornada de Younes

Uma das primeiras adaptações que Ahmad Ali Younes fez ao chegar ao Brasil foi adotar um nome mais familiar aos brasileiros: passou a se apresentar como Armando. A escolha foi motivada pela dificuldade que as pessoas tinham em pronunciar seu nome original em árabe, especialmente devido aos sons característicos da língua que não existem no português. "Ele dizia que era mais fácil assim", relembra Samia.


Após percorrer várias cidades, Ahmad estabeleceu-se em Frederico Westphalen, uma região que, na época, começava a se desenvolver economicamente. Aqui, ele abriu uma loja de tecidos e calçados que se tornaria um marco da cidade, operando por mais de cinco décadas.

 

O trabalho no comércio era uma escolha comum entre os imigrantes sírios e libaneses, que, muitas vezes, iniciavam suas carreiras como mascates, acumulavam capital e, posteriormente, abriam seus próprios negócios, dinamizando as economias locais. Esse padrão foi fundamental para o crescimento econômico e social das pequenas cidades brasileiras.
"Meu pai sempre dizia que, para ter sucesso, era preciso entender o que as pessoas precisavam e estar sempre disposto a aprender"

“Aqui vai uma frase de olho, mas isso é um teste. A frase não pode ser muito grande”.png

Meu pai sempre dizia que, para ter sucesso, era preciso entender o que as pessoas precisavam e estar sempre disposto a aprender.

- Samia Younes Prá

Ao casar-se com uma brasileira de ascendência alemã, Ahmad rompeu com as tradições culturais e religiosas de sua comunidade de origem, onde os casamentos geralmente aconteciam entre pessoas da mesma religião ou etnia. Essa decisão gerou certo estranhamento inicial em sua família, mas sua esposa rapidamente conquistou a todos com sua simpatia e habilidades culinárias. Essa união simbolizou a fusão de duas culturas que enriqueceram não só a família, mas também a comunidade em que viviam.


Entretanto, o preconceito era uma realidade constante. A família Ali Younes, como outros imigrantes árabes, enfrentou estigmas e rótulos como “turcos”, termo que carregava conotações negativas no Brasil daquela época. Ahmad fazia questão de educar as pessoas sobre sua verdadeira origem libanesa, explicando as diferenças culturais e históricas entre os povos árabes e reforçando o orgulho de suas raízes.


Além disso, ele sempre defendeu valores como a integridade e o trabalho árduo, ganhando o respeito da comunidade. Ahmad também fazia questão de envolver-se ativamente na sociedade local, participando de organizações como o Lions Club, onde atuou como presidente em três ocasiões.


Mesmo integrados à sociedade brasileira, os Younes nunca abandonaram suas tradições. A culinária árabe, como tabule, charutos de folha de uva e doces típicos, é uma herança que Samia mantém viva até hoje, compartilhando esses sabores com sua família e amigos. “Quando cozinho essas receitas, sinto uma conexão profunda com minha história e minhas raízes”, relata.

A espiritualidade também foi um legado importante deixado por Ahmad, que transmitiu aos filhos o valor da oração e do respeito às diferenças religiosas. Embora ele fosse muçulmano, deu liberdade aos filhos para escolherem suas próprias crenças, reforçando a ideia de que “Deus é o mesmo para todos”. Algo que se reflete até hoje na religião de Samia, em seu altar religioso encontramos uma Bíblia, logo ao lado, o Alcorão.

“Aqui vai uma frase de olho, mas isso é um teste. A frase não pode ser muito grande”.png

Eu sempre ouvi meu pai dizendo que o importante era manter nossa identidade e, ao mesmo tempo, respeitar os costumes do Brasil.

- Samia Younes Prá

“Aqui vai uma frase de olho, mas isso é um teste. A frase não pode ser muito grande”.png

Deus é o mesmo para todos!

- Samia Younes Prá

A valorização da educação foi uma marca distintiva da família Younes. Apesar de muitos imigrantes árabes priorizarem casamentos para suas filhas, Ahmad incentivou todas as suas seis filhas e um filho a cursarem o ensino superior. Samia tornou-se psicóloga, enquanto seus irmãos seguiram carreiras em áreas como medicina, engenharia e pedagogia. Esse investimento na formação acadêmica não só abriu portas para os filhos, mas também quebrou estereótipos de gênero e tradição.


A presença da família Younes em Frederico Westphalen foi marcada por um forte envolvimento comunitário. Além de sua atuação no comércio, Ahmad dedicou-se a projetos sociais e ao desenvolvimento da cidade. Ele era conhecido por defender Frederico com fervor, destacando seu potencial de crescimento e sua beleza. Para ele, valorizar o local onde se vive era essencial.
Samia seguiu os passos do pai, não apenas na dedicação à sua profissão de psicóloga, mas também como voluntária e líder comunitária. Atualmente, ela é vice-presidente da Associação Cultural Atena e participa de diversas ações sociais, incluindo o apoio a pacientes com câncer.

 

 

 

 

 


Apesar das décadas que se passaram, Samia mantém contato com parentes que ainda vivem no Líbano e acompanha de perto a situação do país, marcada por desafios econômicos e instabilidades políticas, agravados por conflitos regionais e dificuldades de reconstrução. Para ela, visitar o Líbano é como voltar às origens. "Cada pedra lá conta uma história, e sinto que faço parte disso", diz emocionada. 


Em uma de suas visitas ao país, acompanhada do filho mais velho ainda pequeno, Samia foi tomada por um sentimento de familiaridade tão intenso que afirmou já ter vivido ali em outras vidas. "Quando estive em Baalbek, ao ver as ruínas, me senti arrepiada, como se estivesse redescobrindo algo que fazia parte de mim. Minha mãe, espiritualizada, apenas sorriu e disse: 'Você já esteve aqui antes, filha'."


A história de Samia e da família Younes é mais do que uma narrativa de superação; é um retrato vivo da contribuição dos imigrantes libaneses para a sociedade brasileira no geral, principalmente em Frederico Westphalen. Sua trajetória reflete a riqueza de um legado que ultrapassa fronteiras, conectando o passado e o presente, e mostrando que a imigração constrói sociedades novas.

Fontes: Samia Younes Prá, Livro: Sírios e Libaneses no Centro-Norte do Rio Grande do Sul (por João Carlos Tedesco, Alex Antônio Vanin e Jussara Jacomelli).

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"Sempre ouvi meu pai falar da importância de olhar para a cidade com os olhos de quem quer vê-la prosperar"

- Samia Younes Prá

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